quarta-feira, 28 de março de 2018

Anelzinho



Você é criança. Uma mão de menina em sua mão. Cantiga de roda ou um carnaval de crianças. Aquela mão ali na sua mão. Você ainda não sabe dizer se ela é bonita ou feia. Você sabe dizer que é bom aquele enlace. Para o resto da vida.



Eu estava tomando uma com os amigos num barzinho de sempre, quando, sem que me desse bem por isso, a um cano do balcão, me vi de conversa com uma senhora que ali fizera compras e comigo ficou numa prosa em que não cabia mais ninguém. Aos olhos dos companheiros eu já devia estar meio andado nas cervejas: Nei George com aquela mulher judiada; coisas dele.



Coisas minhas:



- Por onde você andou?



- Moro aqui toda vida.



Falou o nome do bairro. Mas nosso assunto era outro.



- Você se lembra?



- Me lembro sim, e te vejo sempre por aqui, mas nunca pensei que você viesse falar comigo.



Não quis perguntar muito sobre sua vida, que imaginei em sua aparência de mulher sofrida, em contraste com que me apresentava, para meio espanto dos que em volta reparavam em nosso diálogo.



- A imagem que eu tenho sua ainda é aquela; custou um pouco te descobrir depois de tanto tempo.



- Pois eu sempre te vejo aqui com amigos.



- Cadê o colar?



Ela deu um sorriso de nostalgia mostrando ausência de alguns dentes, com a mão em socorro imediato:



- Oh, meu Deus; eu tinha roubado de minha prima minutos antes de brincar com você.



Eu devia ter uns nove ou dez anos, e a mãozinha dela encontra até hoje aquecendo a minha, com aquele colar  que ela disse ter “roubado” da prima naquele Carnaval de 1971.



Por isso, ninguém entendia Nei George; mas notei que o garçon, que me viu levar sua freguesa até a porta de saída, com um olhar prolongado nos seus passos com tentativa de elegância, chorava:

.

- Ô doutor, apanha feito o cão do marido..., me  explicou, com lágrimas o garçom.