terça-feira, 13 de julho de 2021

Uma Águia pousa em meu bairro

 


 

Era um carro de passeio como qualquer outro. Não, não era como qualquer outro. Tinha desenhado no teto uma enorme bandeira dos Estados Unidos. De tanto olhar esse detalhe, que encobria o principal, descobri que não era pintura mas um plasticozão adesivado no teto. Que de tanto eu olhar como combatente, nas minhas caminhadas matinais, iniciava-se uma orelha no descolamento da pontinha. Esse combate é homenagem que faço a um amigo que vibrava quando tombava um americano em filmes de índios:

- Tome, filho da puta! dizia entre os dentes.

Havia poucas casas quando fui morar no bairro. De repente era aquilo de construções com tentativa de elegância, carros na porta rente ao meio fio. Esse ficava metade na calçada, metade na rua, por isso que no lusco fusco eu visualizava a bandeira como uma imensa águia, que vinha rapinar em nosso quintal: Petrobrás, Amazõnia e Base de Alcântara.

Não era Copa do Mundo nem nada e esse automóvelzinho todo dia ali estacionado com sentimentos macabros. Decerto. A pessoa deve achar o máximo bandeira dos Estados Unidos no seu carro todo transado, com som  extravagante, calculo.

- .. e os dentes careados, diria o meu amigo numa brisa de lembrança. - ... da filha chamada Merillyn, acrecentaria.

Lembrei-me dos anos 70, quando o professor de Educação Moral e Cívica, no calor do ufanismo, passou como trabalho desenhar o escudo nacional numa cartolina. Apesar de haver caprichado, coisa mais linda do mundo, não recebi avaliação como os demais. Ele me chamou para o canto e pediu que refizesse, quisesse uma avaliação.

E eu queria igual ao do colega, em que ele escreveu palavra bonita: razoável.

Agora temos que de forma escancarada agüentar a idiotice em pleno sol de meio dia. Também não mais vesti camisa de seleção brasileira.

 Não me arrependo de mudar meu roteiro em minhas caminhadas matinais. Comecei a passar por outra rua e parei de ficar vendo aquela águia, sem poder fazer nada contra senão torcer para os índios quando derrubavam mais um americano nos filmes. No tempo em que achava bacana o fato de meu amigo ter parado de tomar cocacola.