BAR NOGUEI
RA
O letrista
contratado para fazer o serviço na fachada do bar, imaginei assim que deparei
com o estabelecimento, devia ter pensado na ocasião “Êta, porra, faltou
parede!”, pois o filho da mãe calculara errado o espaço e o corpo das letras, como
se pode ver.
- É, mas pelo
menos não cometeu erro de separação de sílabas - ponderou um amigo que me
acompanhava, diante de minha curiosidade de ali entrar só por conta do nome do
bar com aquele letreiro.
O barzinho, que
ainda continua ali perto do mercado municipal de Guanambi, ficou por muito
tempo, ainda que meio desbotada, com aquela fachada. Sempre que me encontrava
naquelas imediações fazia questão de passar em frente, para curtir apenas, até
que outro dia divisei o boteco com pintura nova e desenho centralizado das
letras com tamanho único – “BAR NOGUEIRA”. Perdi o fascínio. Vai ver mudou de dono e o
sacana resolveu fazer sua reforma, queixei-me depois ao mesmo amigo.
- Já que você
gosta de apreciar essas coisas, cara, vá lá no boteco de Dori que você vai
encontrar uma tabuleta engraçada. Lá serve buchada aos sábados.
Sei lá. Mas tinha
essa atração pela forma como o povo em geral se expressa no dia a dia para
realizar a comunicação. Ensinava português nessa época e talvez por isso me
despertasse para esses detalhes do uso da língua. Um dia pedi que a turma
fizesse uma pesquisa na cidade. Então, para estudo e debate, conseguimos anotar
coisas como, por exemplo, o aviso que havia num barzinho com mesa de sinuca: “Fincha
R$ 0,50”; num açougue, uma
cartolina branca com letras desenhadas artisticamente, que o açougueiro, cheio
de orgulho, diante do elogio, disse ter sido escrito pela filha: “Não vendemos fiado – Favor não enxista”. Notamos que alguns
procuravam mostrar que estavam escrevendo corretamente e aí é que judiavam mesmo
da tal gramática. Caso do Café Botafoguense de Dedé. Havia uma tabuleta com o
nome das bebidas com os preços correspondentes ao lado: “Penga --- R$ 0,50;
Leco de Peque --- R$ 0,50”. Quer dizer, Dedé, numa confusão de
ortografia, informava, na verdade, os preços da pinga e do licor de pequi.
Entre nós
firmou-se a idéia de que o português é um idioma difícil. Fácil eu sei que não
é. Não é à toa que Rui Barbosa travou disputa logo com Carneiro Ribeiro, que
tinha sido seu mestre, com relação a redação definitiva do Código Civil de
1916. Imagine. Eu aprendi, no entanto, que o importante é a comunicação. Deixemos,
por ora, essa busca sofrida pela língua erudita e vamos às brincadeiras que
surgem com o uso que fazemos dela.
Já que me achava
nessa onda, fui até o boteco de Dori. Não é que a tal tabuleta era bem
trabalhada com letras em entalhes na madeira envernizada! Só que quando li
pensei de imediato tratar-se de outro idioma, o espanhol talvez, pois estava grafado assim: “FIADOSOAMANHATA”.
- Ô Dori, que
porra é essa que está escrito ali?
- Ué, doutor,
não sabe ler? Olhe lá – disse pausadamente: – FIADO SÓ AMANHÃ, TÁ?
Dizem que quando
Dori vendeu o ponto para ir para S. Paulo, o comprador fez questão de pagar um
pouco a mais para que a tabuleta ficasse no bar. Pelo menos, dessa vez, não
aconteceu como no Bar Nogueira, que para essa minha mania acabou perdendo o charme.
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