Ele era o mais velho da turminha e vivia
meio a um canto, como um dos alunos mais fracos. Do contra, ia sempre na
contramão, no seu jeitão áspero, de criança criada sem pai. Mas descobri no
desenrolar das aulas que ele não era tão ruim em desenho. Pelo menos isso. E
passei a ser além de coleguinha de alfabetização, naquele ano de 1969, seu
amiguinho lá na rua. Eu, o xodó da professora, melhor aluno; Davi, o estranho.
Um dia a professora riscou um sinal no
quadro e foi perguntando aos alunos de um a um:
- Que sinal é aquele?
- Sinal de menos, professora.
- Fique ali.
Dirigia-se ao próximo:
- Que sinal é aquele?
- Sinal de menos, professora.
- Fique ali atrás de sua colega.
E assim foi que todo mundo ia dizendo
“sinal de menos” e ficando em fila sem apanhar de palmatória. Restávamos eu, o
cara, o gigante em notas, e Davi, o amalucado. Eu tinha certeza que o sinal
escrito no quadro pela professora era o “sinal de mais” (+) mas como todos
disseram que era o “sinal de menos” (-) e não tinha acontecido punição nenhuma
resolvi acompanhar a maioria quando me chegou a pergunta:
- Sinal de menos, professora.
- Fique ali na fila.
Naquele tempo, só se ingressava no ginasial
(atual 5ª. a 8ª. série) após aprovação no chamado curso de admissão. Só quando
acabou com tal exigência é que Davi conseguiu entrar para o ginasial. A essa
altura eu já me preparava para o segundo grau.
- Que sinal é aquele? - a professora
perguntou, para o último, que era Davi.
- Sinal de mais.
A professora pegou a palmatória e entregou
a Davi:
- Tome, dê um bolo em cada um dos seus
colegas.
As crianças iam passando por Davi com a mão
estendida para receber o bolo punitivo, que ele aplicava com força, e a fila ia
andando até que chegou a minha vez, ocasião em que Davi apenas fez tocar de leve
a madeira, numa palmatoada meramente simbólica: o Golias da classe lhe inspirava
respeito e amizade - consideração recíproca que guardamos para sempre.
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