quarta-feira, 14 de agosto de 2024

Monique


 

Ítalo teve a ideia. Criaria os textos e seu parceiro Preto faria os quadrinhos. Não sabiam eles do alcance de tal projeto, nem em que estariam mexendo. No começo, até que se limitaram ao convencional de fotonovelas já lidas. Depois, arranjaram-se de modo novo que embalou a coisa.  Com estilo. Chegava a informação de que a revista caíra em mãos dos garotos da Rua Nova:

- Eles estavam comentando, O enredo é bom. O motorista namorava a filha do patrão e teve que ir embora – falou Nilo, que negociava novidades para aquelas bandas, inclusive da dupla  que Ítalo estava formando com Preto.

            - Falava o quê, Nilo?

            - Só falava da beleza de Monique.  Da bunda da garota, dos cabelos, dos desenhos,

            - Aí é comigo mesmo – disse Preto.

            - Sai fora, Preto; Você vai ficar...  Aliás, vamos  todos ficar no anonimato. Vai ser arte de Tim H.

            - Quem é Tim H.?

            - Eis a pergunta, meu caro – disse Ítalo.

Tim H, ficou então assim batizado.  Preto tanto caprichou na arte dos  desenhos, que se tornara estimulante à criação dos textos. Nesse perpassar, Ítalo via a adolescência  espichada ao infinito da imaginação. Daí ter que elevar a produção caseira, que era de uns dez exemplares.

- Tá ganhado espaço,  competindo até  com a revista Grande Hotel – voz de Nilo,

            - Você fala que pega lá na banca de seu Nelson também, Nilo?

            E a dupla vibrava com as vantagens debulhadas por Nilo na mesa do Café, nas horas em que Preto, por sugestões de Ítalo, rabiscava Monique em mais um evento.  Desta vez, no Rio de Janeiro, em busca da realização de sonhos.

            - Eles querem saber se Monique vai encontrar o carinha da jaqueta ou não – Nilo contava dos leitores.

            De repente uma escuridão,  Preto havia colocado a mãozona dele no papel e tampado o esboço, de maneira que ninguém via mais nada. Antes, Ítalo ainda apanhou com uma olhada a ponta do lacinho do biquíni da garota na praia de Ipanema e guardou dela aquela imagem.    Ia ser a capa da revista. Quando Preto retirou a mãozona do papel, revelou-se ao mundo uma maravilha, na areia da praia de Ipanema, o corpo de Monique sobrando num biquíni bem transado em dia de sol.

            - Porra, meu irmão,- essa dá até pra ler no banheiro! –. gritou Nilo.

            Firmado como prática de costume, a empresa Tim H começou a incomodar gente graúda, quando o professor de inglês se anunciou em sala de aula da sétima série  B, para uma conversa séria,

            - O que esse porra vai querer com a gente?

A  maioria dos alunos, já passada de ano, pouco se dava às preocupações de moral levantadas pela figura exemplar do professor. Mas, ia-se à luta. Todos em silêncio:

-- O  diretor deste educandário,  antes de adotar rígida medida,  me encarregou dessa “conversa” com vocês – o professor iniciava,

A turma, sem uma preparação para tal assombro, mantinha-se quieta. 

- A mãe de uma de nossas alunas achou na sua bolsa em formato de revista um desenho pornográfico – disse e exibiu a bunda bem desenhada de Monique para a turma embevecida.

Uma algazarra iniciou-se e cessou de vez ante os ensurdecedores tapas na mesa aplicados pelo mestre:

- Silêncio! Proponho que o aluno responsável por essa pornografia se apresente para assinar um compromisso de jamais voltar a envergonhar a escola com a fabricação de tal pornografia, sob pena de suspensão de toda a turma por trinta dias.

Era a Censura, respingo da ditadura, que chegava por essas plagas.

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