Naquele tempo ainda se amarrava cachorro com
lingüiça. Tanto que Quinca acabou acreditando na história boba de que mulher ia
acabar. Correu e foi casar com uma filha de seu Leonildo Pereira. A menina nem
seios lhe pareciam ter nascidos direito.
Branquinha, fraquinha, ainda meio encolhidinha
dentro de casa, na cozinha, e com pouca promessa de que pegaria algum corpo de
moça. Quinca com aquela cara vermelha pontilhada de espinhas e cravos; a
donzelice estampada naquele comprimento de menino graúdo.
Moravam quase vizinhos. Naqueles dias andaram
trocando alguns olhares. Ela num relancear ligeiro de olhos de lagarto, e
Quinca querendo alguma coisa forte que não sabia bem como resolver.
Um dia quando quase todos do povoado se encontravam
na missa, fez-se ouvir de repente o rumor de cadeiras quebradas e riscos de
faca no chão. Muito se passou até o esclarecimento final. Um arrastar de passos
logo em seguida e, finalmente, o cerco para apurar o fato. Lá no meio do salão
da igreja, com uma peixeira na mão e baba pendendo de um canto da boca, ele,
Quinca, para surpresa de todos.
- Quem mexeu com ele? - perguntava-se.
De um lado vinha alguma explicação:
- Pelo que sei ninguém buliu com ele não. Coisa
dele sozinho.
Os parentes de Quinca se aproximaram:
- Que qui foi, Quinca? Com quem você brigava?
- Com ninguém - respondeu mais calmo Quinca.
- Ué, e para quê essa arruaça toda? – perguntou o
pai com tom de voz entre enérgico e ao mesmo tempo camarada, buscando não
atordoar mais o filho.
Quinca baixou o rosto como se fosse chorar e,
bruscamente, ergueu-se, dedo em riste:
- Eu quero é casar com aquela menina ali.
Todos se voltaram para Ritinha de seu Leonildo,
feinha, mas novinha, encolhidinha, como um passarinho assustado.
- Ué, moço, e precisava disso tudo? A gente podia
conversar com o pai da moça... – ralhou o pai de Quinca.
E o casamento foi realizado dali a alguns dias.
Para o jovem casal, a família havia providenciado uma casinha modesta ali no povoado.
Quinca parecia guardar consigo o contentamento de uma grande descoberta que há
muito lhe era ocultado pelos adultos. Então era isso?! Então era assim?! –
ficava matutando. Era o tempo todo no grude com a mulher. Os vizinhos já
olhavam para a sua casa com olhar de censura. Algumas velhas, dessas
igrejeiras, chegavam a se benzer quando os via.
Os dois corriam pelo quintal, um atrás do outro,
entre gritos e sussurros, feito amor roxo de gato, para depois, lá para dentro,
consumarem o ato em gritos derradeiros. “O menino” não cuidava mais do trabalho
no campo, ou, quando, vez por outra, montava a cavalo para arrebanhar o gado,
parava e ficava deitado ao longo do animal se tivesse que conversar com alguém,
tal era o desgaste.
Reparava-se, por outro lado, que Ritinha também
estava só o caco. Quando se avistava Quinca de longe era o mesmo que ver um pé
de laranja coberto de pulgão. O comentário corria solto no povoado.
- Não vê que esse menino tá doente?! – reclamava a
mãe de Quinca.
- A menina está se acabando! – reclamava também a
família da moça.
Nada, porém, parecia conter a fúria amorosa dos
dois. Quinca já dormia com o passarinho na casinha. Roncava um pouco. E quando,
lá pelo meio da noite, lembrava que a vida prosseguia em canto de pássaro, ele
então recomeçava toda aquela fúria.
A coisa chegou a tal ponto, que as duas famílias se
reuniram para uma decisão. Foi assim que, a conselho médico, os dois tiveram
que se separar. Pelo menos por alguns meses, até a recuperação da saúde. Tudo
só se tornou possível quando Quinca descobriu que essa conversa de que mulher
ia acabar era história e que já não se amarrava mais cachorro com lingüiça.
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