sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Transfiguração





Apenas vagamente alguns registros. Não deu para gravar, ou, numa linguagem mais atualizada, “salvar”. Com a mesma rapidez com que passei a entender, passei, depois, ao estado em que me encontrava antes do contato. Com essa coincidência, de que agora sei.

    Sei o quê? Era uma sensação de desligamento –  meu corpo ia ficando sobre a cama, enquanto me via guiado por outros. Mas aí se instalou um medo e então voltei. O que senti, ainda um pouco preso a minha realidade, foi mais que suficiente para deixar saudade. De quê? se não posso dizer? Saudade também não é propriamente a palavra adequada. Poderia descrever aquele instante como de leveza e conforto nessa transfiguração, até que de lá de cima, em companhia de amigos desconhecidos, como que sobrevoando, vi meu corpo acomodado na cama e quis retornar a ele, o que ocorreu de forma automática. 

Porque ultimamente acontecia de encerrar minha leitura da noite com livros espíritas, cuidei haver sofrido influência do texto durante o sono. Foi isso.

Acho que não estava preparado para essa viagem, e fico, por vezes, a buscar esses registros, dando azo à imaginação.

Medo enorme de encarar a morte, percebi o quanto foi reforçada a importância de nossa passagem pela vida, sem pressa, até que se alcance essa leveza, de quem quer voar, sem qualquer obstáculo, e voa...

12.12.2016


sábado, 5 de novembro de 2016

Valores



Os valores se inverteram, companheiro
não adianta
em nossos trilhos desponta
incipiente matagal
da cibernética ultrapassada

a própria palavra companheiro
tornou-se estigmatizada
você é comparsa
sem o ser

é preciso rever seu estoque de palavras
ter cuidado
assassinaram aquelas, balearam outras
que você sabia tanto manejar
e entravam como música

até a música
é outra a canção
que lhe dão
que você deve seguir
como um pão do dia a dia

(é esse o pão
que se divide)

a mentira se tornou fácil e institucionalizada
não precisa de nenhum ardil
não se dão a esse trabalho
os ladrões
a ponta da gravata do objeto do crime aparece
mas só você viu

05.11.2016

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Êxtase




ir dentro e fundo num escuro que se vai descortinando
em cores
claro como a manhã
que fica
feito fruta madura
descoberta a um galho
de árvore
inacessível
à mão inquieta em sua adivinhação
de novidade


01/11/2016

terça-feira, 18 de outubro de 2016

uma cadeira ao lado da cama
feito um criado-mudo -
livros, celular, remédios
à mão das horas.

palavras que fazem as vezes
de outras que dizem ser
enquanto.

a perfeição vem embrulhada,
não se abre à mão
das horas.

que importa agora
a perfeição?

17/10/2016

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Para Sérgio Luís Fortes Carvalho






a vida  batendo lá fora
em minha janela
janela de um 3o. andar de edifício
erguido no centro de Guanambi
domicílio/exílio
eu no meu ofício
garimpando peças úteis e talvez inúteis
entre fios, cabos e “chips”
entre vigiadas e espiadelas
 “melhores momentos” da guerra
tela
tudo ao vivo
os mortos de George Bush
bucho
rodeado de códigos e outros livros
livre
para gritar contra as injustiças
gritar pelos que indevidamente estão entre quatro paredes
mas sem poder gritar com êxito por você
e de repente vem o aviso
nesta sexta-feira
4 de abril de 2003
vem minha mãe preocupada
(ah! sempre assim as mães)
trazer-me essa notícia
que você foi para os céus
quando mal fumamos o derradeiro  cigarro
para dormir o sono profundo
quando a vida insistentemente
em ouros raios
bate lá fora
também em sua janela
que você mal teve tempo
de olhar

                                                       abril/2003

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Sísifo?




esgueirar-me ou explodir talvez
apertar de vez o botão
não cuidamos fosse o fim
de uma escalada de Sísifo

por entre páginas dos dias
é preciso retomar a lição
reler suas cartas
ver o quanto se brigava em vão

tudo espalhado
como pontas dos cigarros
que juntos fumamos
alguém limpando o chão com sua melhor camisa


12.08.2016 NGP