domingo, 8 de abril de 2018

conto






Diante da tela em branco, para dizer ao mundo, como uma cascata de palavras ainda não gastas ou agora revestidas do novo, a autocensura parece procrastinar o texto, que não mais escorre fácil pelos dedos sobre a maciez do teclado amigo. Como música. Sim, escrever prende-se a idéia de sonoridade da água ladeira abaixo, vai encontrando seus caminhos de livre passar ou pensar, encobrindo locais antes estranhos e redescobrindo outros.
Lembrou a canção que fizera para ela e passara pelo facebook:
_ Você é muito talentoso -  digitou ela em reposta.
_ Você é maravilhosa...  -  replicou relembrando seu jeito menina.
_ Até parece! Você que quer me ver com bons olhos – retornou a menina ao modo sapeca.
De estalo: _ Claro.
A canção era de um tom jovem e lírico, a partir de uma leitura profunda que fazia de seus olhos que brotavam fruição de um mundo ainda por conhecer, sob os ventos propícios à ventura e à projeção, com o fundo doce nostálgico de violinos, que ele acrescentaria então:
                       
ah! tanta coisa lá dentro
destes olhos graúdos
teus

uma pétala de rosa
apanhada ao acaso

um livro que voa
um barco  à toa
na linha do vento

o café fumegante
que manchava de leve
o amanhã de ontem

e a voz violino
número cinco
de as bachianas
brasileiras

Mas ficou com aquela resposta na cabeça (“Você que quer me ver com bons olhos”). Ele queria impor um ângulo de visão, sem isenção, a que se devia ajustar a conduta (“bons olhos”), tal como, dizem, a gente cria na mente a imagem de outra pessoa? Seria isso? Voltava àquela idéia primeira de que o mundo está na cabeça da gente – a gente é o que se cria. Faça a imagem, o filme e vive essa realidade. Hmmm! Acredita? Muito se houve também que o homem deve conhecer a si mesmo. Este o segredo. Bem, pense-se assim por ora. Deixar sua contribuição para a leitura da vida, que envolve leitura de códigos, senhas e sistemas. Acha que no caso em tela ele se apoiava nos dois  posicionamentos, mas o que encucou foi porque ela teve aquela reação imediata, como se já esperasse dele aquilo?  A gente fantasia mesmo e ele bem que tinha dela a figura de uma menina mais moldada nas precauções e nas normalidades. Então era isso; a importância do EU. Stop.  
                        Desde criança que se vão fazendo o mundo e as pessoas, não é? E tem uma imagem que se cria. Vai curtindo isso. Tem sido um menino bonzinho, se conduzindo, sem muito reclamar, nada de especial.   De criança é que vem, e a gente vai projetando. Por isso que se apegam uns aos outros em conluio e se firmam, segredos - um roçar de conhecimentos mútuos, uma troca de dicas um dos outros, e marcham juntos vida afora. Nisso, também os sonhos e alguns projetos que ousam então abraçar em parceria. Assim é que flui a vida em seus caminhos que se vão traçando. Bem, pense-se assim por ora. Stop.
                        Isso de gostar tem a ver um pouco com essa troca de segredos. Com o tempo vai-se conhecendo o segredo do companheiro e este conhecendo o seu. Segredo d`alma. Bem, pense-se assim por ora. Segredo d¨alma é forte. Mas é a isso que ele quer chegar. A mãe em relação ao filho é um exemplo maior. Depois se chega lá.
                        Para começar, fiquemos com o calor de mãos ainda na infância. Tira essa dos recônditos dasua existência. O calor das mãos se tocando. O ambiente. Um carnaval. De repente fez-se uma roda de crianças fantasiadas. A mão dela na sua e era bom segurá-la. Só isso. Limite. A mão prenha de ser envolvida ou você apertar uma outra parte que não é você mas que vai se tornando aos poucos, como uma parte que faltava. Como quem brinca de “anelzinho”” e você recebe o anel deixado numa passada de mão. No carnaval de crianças, a mãozinha que se lhe estendia a menina de fantasia.
                        Passam-se os tempos, mas a imagem desse desejo fica num quadro suspenso na memória.
Quanto mais se vai dominando. Os códigos linguísticos, suas combinações e resultados, é que a censura se impõe. É preciso driblá-los, para dizê-los de outra forma. Vai que em decorrência disso, antigamente  funcionava-se  como cascata, exuberante. Tirar leite de pedras. É isso.  Escrever é também extrair-se. Foi-se época de transborde. Conhece-se um pouco do código. Daí que vai assim mesmo, conforme sai, ora encolhido, ora avançando sinais. Depois, volta-se ao ponto.  A cachoeira se contém. 
O caso do toque de mãos principia um jeito de gostar.  Dito isso, passa-se bem adiante, aqui e acolá, a maciez dos teclados segue aos borbotões, invadindo sinais.

quarta-feira, 28 de março de 2018

Anelzinho



Você é criança. Uma mão de menina em sua mão. Cantiga de roda ou um carnaval de crianças. Aquela mão ali na sua mão. Você ainda não sabe dizer se ela é bonita ou feia. Você sabe dizer que é bom aquele enlace. Para o resto da vida.



Eu estava tomando uma com os amigos num barzinho de sempre, quando, sem que me desse bem por isso, a um cano do balcão, me vi de conversa com uma senhora que ali fizera compras e comigo ficou numa prosa em que não cabia mais ninguém. Aos olhos dos companheiros eu já devia estar meio andado nas cervejas: Nei George com aquela mulher judiada; coisas dele.



Coisas minhas:



- Por onde você andou?



- Moro aqui toda vida.



Falou o nome do bairro. Mas nosso assunto era outro.



- Você se lembra?



- Me lembro sim, e te vejo sempre por aqui, mas nunca pensei que você viesse falar comigo.



Não quis perguntar muito sobre sua vida, que imaginei em sua aparência de mulher sofrida, em contraste com que me apresentava, para meio espanto dos que em volta reparavam em nosso diálogo.



- A imagem que eu tenho sua ainda é aquela; custou um pouco te descobrir depois de tanto tempo.



- Pois eu sempre te vejo aqui com amigos.



- Cadê o colar?



Ela deu um sorriso de nostalgia mostrando ausência de alguns dentes, com a mão em socorro imediato:



- Oh, meu Deus; eu tinha roubado de minha prima minutos antes de brincar com você.



Eu devia ter uns nove ou dez anos, e a mãozinha dela encontra até hoje aquecendo a minha, com aquele colar  que ela disse ter “roubado” da prima naquele Carnaval de 1971.



Por isso, ninguém entendia Nei George; mas notei que o garçon, que me viu levar sua freguesa até a porta de saída, com um olhar prolongado nos seus passos com tentativa de elegância, chorava:

.

- Ô doutor, apanha feito o cão do marido..., me  explicou, com lágrimas o garçom.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Fotos tuas





Fito as várias fotos tuas
Num quadro dos anos noventa
Natureza, Nobreza de Ternura
Nas aventuras que inventas.

Ventos que te elevam às alturas
E te trazem de volta ora índia,
Ora rainha, de rosto puro e bom
De garotas do céu de Avalon.

As piscinas cheias de ratos
E os carros estacionados
Continuam lá: estamos acima.

Num abraço de chegada
Prendamos esse tempo
E enfrentemos os versos tristes
Que fumamos em HILDA RISLTE.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Lampejo



Lampejo

fração de segundo – lampejo
te vejo 
sofrível eternização desse conforto

tentativas rabiscos masturbações
do que fomos ontem
à luz do instante raro
da originalidade dos deuses


NGP
07/08/2017