Deviam existir duas ou
três bicicletas de criança na cidade. Uma era a dele, que o pai trouxera de
presente numa viagem que fizera a negócios. Era o lance. Todo mundo na praça
onde morava querendo uma “voltinha”. Havia tantos moleques em redor que,
comparando, seria hoje uma espécie de “rolezinho”.
- Só uma voltinha.
- Não.
E ele desfilando em duas
rodas, bonitinho; os meninos iguais aos meninos pobres de que fala o poeta Manuel Bandeira em seu poema Balõezinhos – desejo
e espanto.
Aquele ajuntamento de
meninos. Nada. Até que apareceu Telma pedindo também uma voltinha. Diferente.
Mas disse: “Não”. Telma falou em
separado umas coisas:
- Se você deixar eu dar
uma voltinha eu me encontro com você.
O que era isso? Diferente
mesmo. Só quem tinha isso de encontro era adulto. Queria entender. E então
Telma saiu montada em suas duas rodas para espanto e protesto dos moleques:
- Por que você não deixou
a gente e deixou essa menina?
Tinha amadurecido naquele
momento sem saber. E não sabia mesmo.
Depois que esmerilhou a
bicicletinha pelos quatro cantos da cidade, Telma veio devolvê-la já um pouco
avançado de horário, sem quase nenhum componente do agora chamado “rolezinho”,
mas ele ficara ali pacientemente esperando por causa daquela conversa.
- Pronto. E você quer
marcar o encontro pra onde?
Não entendia dessas
coisas. Mas, homem, tinha que agir:
- Na garagem lá de casa.
Foram. Os adultos conversavam
na sala; eles eram menino e menina.
Não sabia como era “encontro”.
Então se lembrou de quando saia com os meninos para caçar passarinhos pelos
arredores da cidade e tinha visto uma
figura conhecidíssima como “raparigueiro” com uma mulher no colo. Devia ser
assim – pensou.
- Senta aqui – e ela, de
shortinho, sentou-se em seu colo, e assim ficaram por um certo tempo,
abraçadinhos, pois que foi até aí a lição. Mas já estava ficando tarde para
crianças, e então perguntou: - Amanhã você
vem de novo?
- Venho.
Está até hoje esperando. E
os meninos do “rolezinho” daquele início dos anos 70?
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