segunda-feira, 31 de março de 2014

A Mulher


Esta crônica era para ser publicada no Dia Internacional da Mulher. Mas seria um contra senso, pois que ... Segue o texto. Falam em dia da mulher. Nunca gostei disso, “de dia”. Vá que valha para outras celebrações, nunca para a mulher, porque para elas existe o para sempre e nunca um dia do ano. Quem mais valorizou a mulher, antes de mim (elas que o digam), foi o Mestre. Mulher, na antiguidade, segundo aprendemos nas aulas de Direito, era considerada alieni iuris, ou seja, uma débil mental, uma alienada. Prevalecia então e por muito tempo o poder do macho. Você agora imagine como era. Ele chegou para modificar. Causava escândalo sua conduta à época.  A ponto de dois mil anos depois quando minha mulher ralhou comigo: - Você estava conversando com rapariga. Aí eu tive que recorrer ao argumento sagrado, sabendo que ela é uma católica: - Mulher, até Jesus andou às voltas com rapariga. Grande argumento, que ela acabou pondo por terra depois de alguns segundos de reflexão: - É, mas você só segue essa parte, não é?

Na verdade eu tenho admiração imensa pela figura da mulher. Fui criado em meio a elas, mãe, avó. tias, irmãs e empregadas. Não só da mulher descrita na canção cantada por Amelinha (Mulher nova bonita e carinhosa) como da mulher cantada por Chico Buarque de Holanda (Mulheres de Atenas), mas da mulher mesmo, aquela de que o Mestre cuidou em seus ensinamentos quando aqui esteve entre nós.

Transcrevo abaixo alguns trechos de suas palavras, extraídas de uns pergaminhos encontrados no Oriente, onde o Mestre esteve antes de voltar para sua terra. Tanto que a Bíblia só faz referência a sua infância e sua maturidade. Ele esteve fora, fugira com mercadores, para não ser obrigado a se comprometer em casamento entre judeus, seu povo, quando se destacara, ainda adolescente, no templo, em debate com os doutores.

No momento em que ele falava à multidão notou que um homem só faltou atropelar uma idosa para achar uma boa posição, e aí  ele mudou o discurso:

-Então, Issa(Jesus) acrescentou o seguinte:

 “Não é conveniente que um filho afaste sua mãe, tomando o seu lugar. Quem não respeita sua mãe, o ser mais sagrado depois de Deus, não merece o nome de filho.

-“Ouvi, então, o que vos digo: Respeitai a mulher, porque ela é a mãe do universo, e toda a verdade da divina criação jaz nela.

-“Ela é a base de tudo que é bom e bonito, como também é a semente da vida e da morte. Dela depende toda a existência do homem, porque ela é seu apoio natural.

-“Ela vos dá a luz no meio do sofrimento. Pelo suor de seu rosto, ela vos cria, e até a sua morte vós lhe causais as mais graves ansiedades. Louvai-a e adorai-a, porque ela é vossa única amiga, vosso único apoio na terra.


Quer mais? Leia Os anos ocultos de Jesus, de ELIZABETH CLARE ROPHET, editora NOVA ERA/editora RECORD.


sábado, 29 de março de 2014

Carta à cantora e compositora Maysa
 aos cuidados de São Pedro


Meu filho Daniel, acadêmico do curso de Direito em Uberaba (MG), por vezes, sabendo, porque esteve aqui durante férias, passa mensagem eletrônica: Pai, o senhor ainda continua ouvindo Maysa às duas horas da Manhã? - Moleque filho-da-puta, mas não pode falar assim porque a mãe dele é minha mulher. E o pior, ou melhor, que eu continuo ouvindo a “maluquinha”: voz, interpretação e... composição.

Tantas coisa bobas hoje na mídia... Você vai e ouve (e assiste ao vídio) na internet O Meu Mundo Caiu, ela novinha, matando a pau, na TV japonesa, em preto e branco, como primeira cantora brasileira a se apresentar ali, isso no anos 60, período em que eu nascia, depois ela interpretando Por causa de você, de Dolores Duran e Tom Jobim, já madura e ainda bonita. Tão bonita que devia morrer assim, porque mais poético, num acidente com o seu fusca.

Maysa, aqui meu abraço de reconhecimento pela sua arte.



segunda-feira, 24 de março de 2014

Delícia


Delícia. Andava assim num jeans em que o bumbum (tão bonitinho!), nem grande nem pequeno, musicava a calça. Fosse vendida depois por causa desse lance, nessa onda de consumismo, valeria cem mil vezes mais o vestuário dela, tipo assim a menina de Ipanema, do poeta Vinicius de Moraes, que era de traje sumário. O poeta tivesse visto faria uma canção até melhor, sem desmerecer a garota praiana. E agora? Ele não sabia fazer canção. E nem sequer ousar fazer cantada. Então fotografaria aquilo mentalmente. Para sempre. Estaria no seu disco rígido e ninguém conseguiria retirar-lhe. Possuidor do material.

Que usufruiria quando desejasse. E o fez. Por diversas vezes. O imaginário se desgastando; já não sabia mais daquele lance. Então procuraria realidade; algo do retido na lembrança.

-  Quero uma menina, dona Lisa. Passo aí por volta das dez horas. Bumbum e de calça jeans.

- Vou lhe dar um presente: começou agora. Ela vai estar fingindo telefonar num orelhão em frente ao hospital lá do centro.


Quando passou e viu, constatou que não era presente; era um sonho. Num jeito juvenil de fingir ao telefone público. Deu uma buzinadinha de nada e abriu a porta do carro. Depois, esqueça-se desse detalhe da calça jeans e fixe-se só na imagem estirada na cama, assim de não poder nem passar a mão para não causar estrago - um bumbum para ser visto e sonhar.

sábado, 22 de março de 2014


 Estrela

você é estrela
e não sabe
aliás, você nem observa
as que brilham no céu
uma delas é você
e você não cuida disso
eu, como o poeta Olavo Bilac
converso com todas elas
sem você, meu irmão, saber



28.09.2012

quarta-feira, 19 de março de 2014

Os galos

14 horas
bairro Santo Antônio
os galos cantam
fuso horário, sei lá
e eu estou vivo
ou os galos cantam certo?

os galos insistem
eles não são tais quais os de João Cabral Melo Neto
os galos, eles não sabem
ou sabem?
os galos de seu Antônio
no bairro Santo Antônio
às 14 horas
Guanambi(BA), 12.03.2014



A música que rola

a música ridícula rolando
pobreza de gosto
e as pessoas tão pessoas
com uma mina dentro de si
mas você não pode impedir
e então chora a seu modo
amando a todos
sem nada poder fazer
senão sorrir
e este poema
aqui
Guanambi(BA), 18.03.2014


sábado, 15 de março de 2014


Saudade da menina feia 



Era feia. Não aquela menina do poema de Manuel Bandeira, nem aquela do poema da Estrela da Manhã, que ele desejava até a última degradação; simplesmente com ausência de beleza. Mas deu-se que agora ele estava com saudade dela.

Num lance.  Enroscou-se naquele dia. E o rígido da sua memória gravou. Agora aquela lembrança. Tantas que existem por aí de dez a zero. Mas e o jeito de se enroscar e ficar assim juntinhos... E o jeito outro de dizer vou ali me cuidar e volto, e depois voltava envolta em ternura para acontecer. Tinha a juventude e uma triste tatuagem incompreensível. Mas já adiantada em vida. Feia. Feia não, com ausência de atributos. Feia. Mas e a enroscada? Tornava-se a melhor coisa do MUNDO, assim mesmo em caixa alta. Merece. Vá fazer o que ela fez?

Como é que se fica com essa saudade? – saudade de mulher feia. Jamais poderia disputar a candidatura de sequer secretária de candidata a miss. Tinha os seios de acordo. Tinha um sorriso. Seu abraço era abraço de se escreverem páginas e o resto que fosse para os infernos. Embaixo se lubrificava e a condução se tornava mais fácil. Quer mais? Pássaros cantavam lá fora; não tinha a capa pendurada como na canção de Roberto Carlos, que isso é coisa de música.

Viviane era música melhor.

quarta-feira, 12 de março de 2014



FICO TE DEVENDO UM SELINHO 



Era bonita e pronto. Mas naquele momento, tinha que se contentar apenas com isso. Assim ao lado. Não tinha como. Olhos esverdeados; o cabelo - falou depois - , jeito que dera em casa. E  a juventude? Os olhos. De pegar seu último tostão se fosse rapariga, mas não era. Empenhou-se. Fez o que podia fazer por ela.

Final. Proteção. Olhos meio compridos no negócio: aquilo tudo, olhos e juventude.

- Você vai comigo.

Perfume. Como se tivesse saído de um banho. Tipo se enrolada na toalha que se abre e não se abre. Os olhos. As pernas (tão delícia na calça jeans.).

- Te entrego em casa.

Mentira: carregaria para sempre. Mas só até uns metros, o que  efetivamente ocorreu.

- Pare aqui.

Olhos.

- Me dê um beijo.

- De lado; muita gente olhando.

- Queria pelo menos um “selinho”.

- Faz isso: fico te devendo um "selinho".

Aí, ele até preferiu  que se guardasse na lembrança tal fala que propriamente o ato.

terça-feira, 4 de março de 2014

SUGESTÃO DE ANÁLISE


NÓS E AS SOMBRAS

CECÍLIA MEIRELES


E em redor da mesa, nós, viventes,
comíamos, e falávamos, naquela noite estrangeira,
e nossas sombras pelas paredes
moviam-se, aconchegas como nós,
e gesticulavam, sem voz

Éramos duplos, éramos triples, éramos trêmulos
à luz dos bicos de acetilene,
pelas paredes seculares, densas, frias,
e vagamente monumentais.
Mais do que as sombras éramos irreais.

Sabíamos que a noite era um jardim de neve e lobos.
E gostávamos de estar vivos, entre vinhos e brasas,
muito longe do mundo,
de todas as presenças vãs,
envoltos em ternura e lãs.

Até hoje pergunto pelo singular destino
das sombras que se moveram juntas, pelas mesmas paredes...
Oh, as sem saudades, sem pedidos, sem respostas...
Tão fluidas! Enlaçando-se e perdendo-se pelo ar...
Sem olhos para chorar...



O poema NÓS E AS SOMBRAS é composto de quatro estrofes, com versos livres e brancos (apenas nos dois últimos versos de cada estrofe aparecem rimas emparelhadas). Inicia-se com a conjunção “e”, o que denota a idéia de seqüência de uma situação já existente. Nas três primeiras estrofes o eu-lírico da autora se soma à presença das demais pessoas (“nós”, “éramos”,  “sabíamos”), para adiante, na última estrofe, emergir de forma individualizada (verso 16), quando se distancia pela descoberta que faz ao refletir sobre a vida.

O ato de comer e falar (1ª. estrofe) encerra a idéia de desfrute dos prazeres que a vida oferece, daí o quadro de conforto em que se encontram as pessoas. Noite estrangeira passa a imagem de um momento num outro país como a de noite estranha, como prenúncio da conclusão a que chegará a autora ao questionar a trajetória de vida dessas pessoas. Paralela a esta situação há a projeção das pessoas representadas pelas sombras, que destas se distinguem pela ausência de voz, numa alusão ao lado frágil, passageiro, efêmero, pelo que contém de insignificância em face de outros valores.

Essa efemeridade é enfatizada a partir da segunda estrofe (“éramos trêmulos”), contrastando com a perenidade representada “pelas paredes seculares”.

A situação especial de conforto dessas pessoas em face da realidade é tal que a autora chega a achá-las mais  irreais que as sombras.

O verso no. 11 (“Sabíamos que a noite era um jardim de neve e lobos”) traduz a consciência que se tem da dura realidade. Os versos que se seguem mostram a indiferença e o desprezo que sentem por esta situação, voltados que estão tão somente para o desfrute das boas coisas.


As sombras seriam a projeção dos nossos atos durante a vida, para ela transitória, e que, portanto, por ser uma passagem, não se justifica apenas cuidando-se somente dos prazeres, sem olhos para o outro lado.