Logline: Uma encomenda de campanha publicitária às vezes pode ter outras
utilidades.
Com qualquer agitação local, começaria a
incrementar a campanha. Nesse embalo,
Beto fez manobras na frente do
comitê que levantou poeira e efervesceu a garotada. Saiu cantando pneu num
rasgado, em busca do novo lance. Era o jingle.
Tinha que ir até o Studio de Tom, na cidade vizinha, apanhar a mídia para ver
tocar fogo na coisa e dar o ponta pé inicial. Partiu sob gritos do nome do
candidato.
- Beto foi buscar. Daqui a pouco chega – era
uma companheira de partido sossegando a expectativa dos demais.
Tinha que ir num pé e voltar no outro, como se
dizia então. Beto sentiu o peso da
responsabilidade partidária, Podia delegar esse poder para um dos contratados,
mas até nisso não cabia vacilo. Deixaria
com ele, traria a encomenda conforme o trato. Ao passar na entrada, viu Lia no
ponto, uma garota com quem tinha um acerto de contas, enfiou a cabeça na
janelinha do carro e disse aos berros:
- Lia, só vou ali no Stúdio de Tom e volto pra
gente ir embora. Me espere, ok?
Tanto assunto de política na cabeça que já ia
se esquecendo da figura de Lia, Ela, ainda mocinha, com cachos de cabelos
escuros a contrastar com sua pele branca. O chique ficava por conta da blusa
fina que punha em destaque projetos de seios perfeitos. Ela andava carente de
um comando paterno. E assim mesmo vivia beirando movimentos de adolescentes. Um
dia, quando surgia um clima para práticas de rapinagens, Beto, vendo solitária
figura de ninfeta no portão, entendeu de agir como um tio:
- Pra casa, Lia, isso não são horas de mocinha
estar fora de casa não. Se a moda pega...
Sabia-se lá o psicológico de Lia, como se
consolou em casa. O certo que o tempo fez das suas perversidades. Achou de ver
a estampa de Lia, de novo, com ligeiras adaptações para o modelo completo de moça, numa estação de primavera.
E Beto sem as chances de se estender num papo com a garota, às voltas com sua
independência e sofrendo marcação de namorados.
Numa pausa que teve, segredou-lhe um elogio respeitoso, que depois acharia simplesmente “careta”. Bem feito, corno, quem mandou ralhar com tom mais para ríspido com uma adolescente? Era passado. O importante era a Lia de agora, Lia mulher, com projetos de seios realizados, olhos negros de jabuticabas. Lia, mãe solo, esperando carona de Beto, para ajuste de antigas contas, seguindo o mesmo estilo de apressado. Apanhou a mídia no Stúdio de Tom e, de volta, viu Lia, apetitosa, no ponto, dispensando caronas com a mão, à espera dele.
Encostou o carro na sarjeta e abriu a porta,
como que combinado, ela entrou e encontrou um cumprimento nos braços ansiosos
de Beto. Ligou o som do carro e deixou que o jingle do partido encobrisse o
silêncio que se estabelecera entre eles. Estava animado com a musiquinha, que,
encerrado mais um item de trabalho, ia
cair no agrado da turma do comitê e estava dado o ponta pé inicial.
Meio caminho andado, foi costeando o carro
dando seta e pegou um atalho à direita, quando Lia pareceu se assustar:
- Ué!...
Em silêncio permaneceu Beto ao entrar num
lugar de luzes e, num tempo exíguo, fazer os reparos necessários num ajuste de
contas do passado.
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