quarta-feira, 25 de novembro de 2020

A Árvore de Natal de Dona Sinhá

 

 

Nunca foi de haver uma decoração lá em casa por certas ocasiões de festas populares. Lembro-me de uns três pauzinhos de madeira nova que o vaqueiro inventou de arrastar e encostar na frente de casa num São João desses, num tempo que lá vai fumaça. A lembrança é da pobreza que representavam os pauzinhos. Tanto que a gente teve que se socorrer de outras fogueiras cansadas, na vizinhança de rua. Tomamos “emprestado” um pau da fogueira de vovó, ao lado, um da fogueira robusta de Dona Virgulina, mais na frente, uns dois de outra fogueira meio esquecida acolá, e assim fizemos nossa fogueira de S. João, com alguns poucos fogos garantidos pela venda de Possidônio, que fornecia para a família.

 Mas no Natal, nunca tivemos igualmente a Alegria dos enfeites (a gente falava assim, "enfeites") pela casa adentro. Até que um dia, num piscar de olhos, num passe de mágica, como é próprio do espírito reinante então, encontrei uma bela árvore de Natal, com os arranjos de sinos pendurados  e verde em  papel crepon distribuídos de acordo. O encanto foi imenso porque amanhecera ali em casa, que nunca fora de combinar com esses caprichos mas compensava a gente com os presentes dados a cada um. Mas sem o conforto que oferecia o ambiente, como a lapinha de Dona Glória e a lapinha de siá Maria de Orlindo (que chegou a morrer duas vezes). Afora esse detalhe, era de uma maravilha sem tamanho. Você vai entrando na sala e dá de cara com o espetáculo duma árvore de Natal, que chega a suavizar-se de uma repentina calma interior.

Aqui dou um corte na prosa para recobrar minha manhã, quando a caminho da escola, passando pela casa de Dona Sinhá, a mãe de Tequinha, deparei-me com uma estupenda árvore de Natal, e falei com mãe:

- Igualzinha, mãe. Na casa de dona Sinhá tem uma igualzinha.

- Foi ela quem mandou entregar essa de presente pra você, meu filho.

Que tristeza a minha nessa hora! Tinha elogiado tanto a árvore de Natal, com alegria de menino, que Dona Sinhá, no seu jeito infantilizado de ver as coisas, resolveu me mandar de presente:

- Ela é assim mesmo, meu filho, tudo que tem em casa é dando para os outros. E a casa cheia de filhos...

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