segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

 

Letícia

 

"Quem te viu, quem te vê", refletiu Ítalo ao adentrar o bar e observar Letícia despenteada, com sinais de embriaguez, em farra com "amigos".

- Separou, cara, faz pouco tempo – alguém informava próximo à mesa escolhida por Ítalo.

- Casou pra dar gosto aos pais adotivos. Casamentão. O noivo era funcionário de uma estatal – um outro colocava mais recheio.

         - Lembro-me dela penteada mas comendo a gente por baixo.

            Ítalo era testemunha desses fatos. Ela sempre o tratou com maior respeito, mas também andou comido com os olhos graúdos dela. O pai tinha feito apresentação tempos atrás, sorriso grande:

            - Minha moça, noiva do Sr. Nelson Palmeira.

            Ele se limitou a dar os parabéns, mas percebeu nela o detalhe de estender o olhar de maneira discreta. Ela era jovem, estava em plena saúde e prometia muito de Sodoma e Gomorra nas sombras daquela catedral.  Apenas uma constatação de macho, que só o tempo se encarregaria de mostrar.

            - Quem já foi essa menina, cara?

            - Minha irmã me contou que ela falava de um fogo que tinha dentro dela, que ninguém dava jeito.

            Respeitoso, Ítalo também não correu atrás, mas agora que se tornava mais fácil, parecia queixar-se de haver chegado com atraso. Corpo mais solto, porém desajeitado após primeiro filho. Ítalo tinha que pedir a cerveja e caminhou para cumprimentar Letícia:

            - Olá, Letícia,

           Ela ergueu-se para beijinho, entusiasmada, e  pediu que sentasse com ela, no que ele acatou, para tanger dali uns carinhas que estavam sobrando. Letícia tentou puxar para um papo mais descolado:

        - Ficamos juntos, afinal, depois de tantos anos, não é, Ítalo? A gente comentava, eu e minhas primas, da beleza dos homens que apareciam lá em casa. Você mesmo era um deles. Só que quando meu pai me apresentou foi como noiva de Dorivaldo.  Mas era um tempo bom.

            Encaminhado na bebida, Ítalo foi logo se enturmando na conversa, apegando-se a lances picantes, de quando ela, a mulher de argolas, esbanjava categoria:

            - Eu tinha uma tara por você, Letícia.

            - Oxe, então deu empate, porque eu também tinha mas não podia, que estava comprometida.

            - Será que agora dava para desempatar? – alguém na mesa perguntou na resenha.

            - Vou levar essa menina num salão de beleza de um amigo e dar uns tratos no cabelo, que era tão bonito - disse Ítalo num rasgo de contentamento.

            Era um final de tarde, Ítalo apanhou a mulher descabelada e a carregou para dentro do carro, dizendo ao dono do bar:

            - Pode deixar tudo pra mim aí,  cara. 

 


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