quinta-feira, 19 de junho de 2025

 

Selmas II

 

                        Soube depois que a família havia mandado para S. Paulo a menina Talita. Diziam que para não namorar Ítalo.  Por isso que o tempo parou de escoar ali na cidade, pensava ele enquanto olhava o movimento lerdo dos carros na rua principal, até que no momento passou um caminhão e de onde estava Ítalo gritou no estalo:

                   - Hanrrum! Vocês viram o que eu vi? Talita na boleia do caminhão!

                   O dono do barzinho abriu a boca informando que não era Talita, que essa estava em São Paulo com uns tios.

                   - Oxe, e quem é?

                   - É Selmas, a irmã dela, a mais velha.

                   - É a cópia fiel de Talita - disse Ítalo. Depois, arrematou sorrindo: - É minha: eu vou ficar com ela.

                  - Ih, pega leve, cara: é minha prima – barrou Ivo.

                   - É bom que você vai ser o meu pombo correio e vai dizer a ela que estou na área, que quero namorar.

                   De dentro de Ítalo bateu uma certeza: ele iria estar a serviço de vigilância daquela menina, proteção e participação em todos os seus atos.  Não podia sair por aí, sem anuência dele não. O pombo correio iria entrar em ação. E não tardou, no dia seguinte ele chegou de retorno. Movia a cabeça negativamente quando perguntado na tampa:

                   - E aí, Ivo?

                   Ivo não viu a uva como na escolinha, mas a distância da prima para Ítalo. Ela, professora primária, com uma turma de alunos já arranjada pelo município; e Ítalo, estudante, sem completar seus estudos, tendo ainda que prestar vestibular. Ivo respondeu como se fosse jogar água fria na fervura:

                   - Ela disse que quer casar.

                   Foi o mesmo que dizer: “Sai fora, cara. Não é pra você não.” Mas o garoto se manteve firme, não se deu por vencido, e causou espanto ao dizer de imediato:

                   - Pois diga a ela que, coincidência, eu também quero.

                  Naquela noite, eles se encontraram na pracinha para tomar uma coca-cola e esclarecer a situação. Viu de perto a irmã de Talita e a achou tão bonita quanto a outra, ora uma mais que a outra, em sistema de revezamento.

                   - Ué, menino, você respondeu por Ivo que quer casar. Você é um menino ainda.

                   - Vou fazer dezoito no final do ano. E pare com essa coisa de me chamar de menino.

                   Para se comportar assim, decerto que ela o estaria confundindo com um de seus alunos. Só podia. Naquela manhã, ele a seguira e ficara encantado ao vê-la de braços dados com um grupo de crianças voltando do recreio, chupando picolé.

                   - Peço desculpas – ela disse.

                   Ítalo, mudando de assunto, contou umas histórias. Mas viu que só ele falava, então resolveu dar por encerrado o papo, no que ela se manifestou:

                   -Vai, por que parou? Conte mais.

                   Ele já estava até aborrecido com a beleza de uma estampa de moça ali de frente, só tratando-o por menino, como se ela fosse adulta de tamanho ideal e ele como um mero aluno, nada levado a sério.

                   - Deseja ouvir mais ? Se você gosta tanto, compre um livro de histórias – disse, e só não se retirou porque seria mais feio.

                   E ela sentiu a bordoada, o que era suficiente para Ítalo. Em seguida, resolveu a situação com um beijo de despedida e a renovação da promessa de um encontro. Considerou a partida desafiadora, com algumas caneladas e erros de arbitragem, mas saiu vitorioso com um placar magro de um a zero.

                  O tempo voltava a escoar e então logo a cidade era pequena para caber a alegria do mais novo casal de namorados.

                   - Esses meninos, tem que pegar eles e casar – ouvia-se diante da pegação dos dois.

                   Porém, esse era apenas um plano para eles. Não se estava tratando disso na ocasião, mas havia algumas provocações do lado de Selmas. Essa forma de agir resultou na ideia das alianças de noivado, que Ítalo não conseguiu mais adiar. E não custava nada, como de fato não custou.

                  

Nenhum comentário:

Postar um comentário