domingo, 13 de janeiro de 2013

Solon - o galã


Solon - o galã


No início foi aquela confusão. Andaram acusando um e outro da turma. Na realidade, ninguém senão a própria vítima teve culpa.

- Olhe aqui, meu amigo, mulher só não vai com cobra porque não sabe distinguir o macho da fêmea - falou o pai de um dos rapazes, dando por encerrado o caso. O pai da moça que fosse lá tomar suas providências.

Certo que Solon era um tipão: alto, forte, olhos esverdeados e pele morena. Mas só mesmo uma assanhadinha como aquela moça para se meter com um cara que toda cidade sabia ser doente mental. O trabalho que dava a família era enorme. Muito comum na vizinhança se ouvirem os gritos de aflição da pobre mãe. Era um tal de “Solon! Pare, Solon!” que enchia toda uma manhã e tarde inteira.

- Solon! Oh, meu filho, deixe disso! Pare de enfiar esse dedo na tomada que você leva choque.

- Choque é bom, mãe?

- Não, meu filho. Choque pode até causar a morte - explicava a mãe com paciência.

- De onde vem o choque, hein, mãe?

- Solon, meu amorzinho, pare. Venha para o alpendre, venha.
Logo em seguida, via-se assomar à porta aquela figura boa pinta, em bons trajes, mas num jeitão engraçado do abobalhado que sempre fora.

Quando tudo parecia calmo, a mãe pedalando a máquina de costura, Solon saia de suas reflexões idiotas para, de maneira brusca, indagar:

- Mãe, oh mãe, onde mora Deus?

- Deus mora no céu, meu filho.

- Mãe, oh mãe, urubu vê Deus?

Fulminada pela idiotice do filho, já rapaz, dona Rita quase que se deixou espetar pela agulha da máquina de costura.

- Solon!!...

Até que surgiu aquela história do jipe. Visitas na sala, quando de lá veio Solon:

- Mãe, já pensou se pai fosse um jipe e a senhora uma jipa?  

- Solon!!..

- Eu seria um jipinho, né, mãe?

- Solon!!...

Depois do grito, vinha novamente a brandura de mãe:
- Meu filho, você já está crescidinho. Pare de fazer perguntas tolas - pedia, chorosa mas afagando com ternura o filho que Deus lhe dera.

Com o tempo, os pais de Solon entenderam que, apesar de tudo, ele era um rapaz e devia como tal sair da barra da saia da mãe. Procurar enturmar-se um pouco com as pessoas de sua geração. Quem sabe o desenvolvimento mental não melhorasse? Foi a partir daí que Solon passou a andar com a turma. Todos o tratavam com o devido cuidado, seguindo as recomendações da família preocupada.

Quem, no entanto, iria adivinhar aquele sucesso? Sempre que a turma freqüentava alguma festinha, lá vinham os suspiros femininos:

- Uau, que gato!

Sem a companhia dele não havia suspiro algum. De forma que a coisa foi-se ajeitando. Solon entrava com a beleza e o resto da turma com o papo. No final, cada um a um canto mordendo uma garota, e Solon, coitado, já entregue à família, são e salvo.

Bem que naquele dia houve um certo descuido. Contudo, não se pode falar em culpa de A ou B. Solon sentadinho com a garota (seria de outra cidade?), de conversas e beijinhos, só podia ser ficção científica. Parecia um artista de novela. Tinham-se esquecido de levá-lo mais cedo para casa, envolvidos que estavam no baile, e quando deram por isso já foi tarde.

A garota tinha achado o máximo. Toda conversa de Solon ela entendia como brincadeira das mais humoradas. Tudo chocante. E ficava de gritinhos ante o vozerio de Solon.

- De quem é esse dedinho?
- É seu, meu gato.

- Então vou pegar ele pra mim - disse Solon, prendendo o dedo mindinho da moça com sua mão direita.

- Pode pegar, meu gato.

- Então vou quebrar...

-  Quebra não, meu gato: ele é seu.

- Eu quebro...

Quando se viu foi o estalo. A moça deu um urro. Num rápido movimento, Solon - o galã, havia-lhe arrancado o dedo.






2 comentários:

  1. Tio, adorei o texto e visitarei sempre este blog, continue nos presenteando com seus textos. Beijo
    Catarina

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  2. Palavra. Gosto de crônica nessa linha. Escrevo pros amigos. Beijos.

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