A mulher dos tomates
Em
uma academia, ela chamou a atenção discretamente, pois ele também a encarou
dessa maneira, antecipando o que poderia ser o tema de um possível diálogo
entre eles. Para Ítalo, era a mulher dos
tomates, a cunhada de um quitandeiro do bairro. Mas, olhando bem suas partes, ela
não era a mesma, puro equívoco. Tinha o
corpo trabalhado, a senhora.
-
E a mente aberta aos negócios – Ítalo completava o raciocínio.
Olhou o rosto e confirmou:
- È mesmo a mulher dos tomates.
Possivelmente, atrás de um balcão,
ela ocultava a maravilha que se desvendava através das roupas esportivas, mais
adequadas. Aquela era uma área comum para exibição de coxas, braços, pernas e
mamas. Ele percorreu as pernas da mulher e percebeu nobreza naquela alvura de
coxas, sem sinais, no gesto sério ao erguer os alteres, num agachamento com
barra, e refletiu:
- Com certeza não é a mulher dos
tomates.
Conforme o consenso estabelecido, o
princípio da inocência deveria prevalecer na incerteza. Assim, deveria
prosseguir. Em um movimento rápido de encantamento, ela se posicionou no centro
da sala com a destreza de um atleta e, em seguida, caminhou até outro
dispositivo que estava desocupado. E lá continuou a pedalar. Ela viajava para
longe, sem deixar o ambiente da sala. A imaginação de Ítalo a acompanhava.
Um pequeno detalhe transformava tudo, como podia uma mulher se
transformar dessa maneira num instante? É aquela história da mulher com uma
flor no cabelo – pensou Ítalo. Ou talvez tenha sido uma decisão que afetou os
trajes e o comportamento. Quem a observava ocasionalmente no cotidiano não
poderia acreditar na bela imagem que se apresentava diante dele. Ele poderia
"tomar boca" com a mulher, como se costumava dizer, para melhor
enquadrar a conversa, mas agora seria descortês. Seria um instante apenas de
admiração. Ela deveria possuir um parceiro. Como é que ele não fazia companhia?
Esses pensamentos ferviam em sua mente. Deixar fluir! No mínimo, ele deveria
permanecer à espreita na porta. Aguardar
para destravar a porta do carro estacionado, tal como na música "Esse cara
sou eu", de Roberto Carlos. Era a forma perfeita para um clipe.
A mulher
dos tomates se aprontava para ir para casa. Apanhou no armário da recepção uma
mochila, falou qualquer coisa com o professor, abrindo um leve sorriso e
caminhou para o local reservado para veículos, sem ninguém pra lhe abrir a
porta do carro, o que era uma falta gravíssima.
O professor
podia dar outras referências sobre ela, a de blusa cor de rosa. Aliás, teria que se certificar primeiro. Com a sua aproximação, para não demonstrar
grande interesse, Ítalo indagou, apontando a mulher:
- Ela é...
Mal
terminou de falar, foi atropelado pelo professor, que, sacudindo a cabeça, respondeu com cumplicidade:
- É. Ela
mesma.
“Ela mesma,
quem, cara pálida?” Não querendo demonstrar interesse, Ítalo acabou deixando
ficar com o que estava na sua mente, “a mulher dos tomates”.