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Ô Bigu, você já deu comida aos pássssss-saros? - quem assim perguntava era Dr.
Ginaldo Cerqueira Gomes, médico pioneiro da cidade de Candiba. Moral e figura
querida até hoje, mesmo depois de passar a residir em Guanambi. Afinal, naquele
fim dos anos sessenta, difícil para cidades como Candiba ter ali um médico que
trabalhasse e também morasse.
Bigu,
vizinho, morava com sua mãe, dona Ana de Dodô. Nas horas vagas era servente de
pedreiro. Digo nas horas vagas porque depois dessa empreita Bigu passou a ficar
mais ocupado com os pásssssss-saros do Doutor:
-
Bigu, estou indo a Salvador. Cuide de meus pássaros. Lave as gaiolas. Troque a
água. Duas vezes ao dia. Alpiste e
canjiquinha. Não se esqueça.
A
área da casa em que ficavam as gaiolas era em forma de L. O povo pobre, nos
exames, fazia questão de trazer sempre algum passarinho de presente. E haja
espaço. Quando Bigu terminava de cumprir
metade de sua tarefa, lavar gaiolas, trocar água e colocar alpiste ou
canjiquinha nos vasilhames, já era perto de meio-dia.
_
Bigu, não se esqueça: água duas vezes ao dia.
Interessante
que pelo sotaque soteropolitano do Doutor, que Bigu sabia imitar, nos
intervalos, sempre havia um que lhe pagava a pinga. Esse “dia” era pronunciado
de forma meio sergipana, linguodental, e não de forma molhada como
pronunciamos. E assim andavam os dias na monótona cidade de Candiba.
Um
dia Bigu, nesse costume de imitar Doutor Ginaldo e achar nos bares quem lhe
pagasse a bebida pelo engraçado do sotaque, entrou na sorveteria de Zé Pereira
já fazendo sua propaganda:
-
Ô Bigu, você já deu comida aos pássssss-saros?
Mas
aí, lá do reservado do bar saiu uma voz:
_
Ô Bigu, largue minha vida, viu?
Era
o próprio Dr. Ginaldo, em pessoa, mas Bigu, cá fora, protestava:
_
Porra, já tem gente imitando Dr. Ginaldo melhor do que eu!
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