domingo, 23 de dezembro de 2012

Meu bem, meu mal


Meu bem, meu mal


Zeduardo estava no clube. Fim de tarde. Batia o “baba” da sexta-feira. Ao correr pela ponta-direita e fazer um lançamento, viu–se surpreendido pela estampa de mulher decente e bonita que se aproximava da linha de fundo do campo. Parecia ser sua mulher. Parecia não: a própria. Zeduardo limpou apressadamente o suor do rosto já com interrogação de todo tamanho. Pombas, alguma coisa tinha acontecido em casa. Mãinha nunca fora de acompanhar seu futebol. Sempre foi de cuidar da casa, dos meninos. Que seria? Foi com cara de choro que correu ao encontro da mulher:

  - Que qui foi, mãinha?

 - A filha de Chico Menezes taí. Chegou ontem de São Paulo – falou          como algo de grave.

- Não entendi nada.

Chegou-se mais ao ouvido de Zeduardo:

- Vim te avisar que tem um comentário aí que ela tá com Aids.
 
- Oxente, que tenho eu com isso?

Mais afastados, porém ligados, os colegas acompanhavam a cena: a mulher de Zeduardo falando com o dedo indicador em sua cara.

 - Falo para prevenir: cachorro do jeito que você é... – disse, fez meia-volta e se retirou como se tivesse dado um combate.
Era só o que faltava. Nunca tivera nada com aquela garota. Relação amistosa apenas. Era realmente do tipo boa, como se diz, mas daí a alguma coisa era uma distância. Mãinha estava maluca. Besteira. Ali era terminar o baba, tomar uma ducha e encerrar o dia com cervejada e o papo de sempre com os amigos. Página virada.

No outro dia, no entanto, céus e terra se misturaram. Zeduardo, na praça com os amigos, viu descortinar-se aos seus olhos, de shortinho jeans, tênis, blusinha vermelha, cabelos cacheados, o morenaço vivo de brasilidade. Era ela. A dita. Ali.

Passado o suspirar de desejos coletivos, todos quedaram-se num só lamento:

 - Que pena! Com Aids!

O comentário realmente se estendia por toda a cidade. Mães chamava à atenção filhas que se atrevessem a sair em companhia da menina. Rapazinhos da cidade também se esquivavam. E a turma trintona de Zeduardo pelos cantos dos bares em críticas à medicina, à ciência, que não encontrava o remédio ideal para combater essa doença.  Sentadinha a uma das mesas da lanchonete, mal sabia a morena que logo depois de sua saída, viria o garçom com flanela e álcool para tirar a Aids da cadeira.

Quando, passando rente à mesa da turma de Zeduardo, a morena, sorriso aberto, meneou a cabeça (cabelos cacheados) em cumprimento, um dos amigos não resistiu:

- Que venha a morte, mas depois do paraíso. Eu não me importaria. Sinceramente. Hoje eu tomo todas.
O que dissera parecia valer para todo o grupo. Mas tomar mesmo todas foi quando, dias depois, a garota já em São Paulo, descobriram que tudo não passara de artimanha das mulheres da cidade. Tramaram toda a estória nos tititis do salão de beleza local.

Em sinal de protesto, alguns proibiram as esposas de freqüentar o maldito salão. Mazin, que era solteiro e não tinha mulher para mandar, preferiu dar uma porrada no garçom: em vez de retirar da cadeira a Aids, o filho da puta havia era limpado um pouco do açúcar deixado ali pela  garota.

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