Naquelas férias de 1980, que Edu se iniciava como rapaz num Chevette seminovo, que o pai recebera em negócios, tornava-se imprescindível uma garota para que se completasse o quadro: filho de família classe média que prestava vestibular na Capital,
A prima vinha de
apresentar a vizinha, cabelos de cachinhos pretos, cara de imberbe rebeldia:
- O nome dela é
Rose. Vocês já podem conversar. Se forem dar umas voltinhas – relanceou os
olhos pelo carrinho marrom estacionado na sombra e arrematou: - é só não irem
pra longe.
Edu olhou,
envergonhado, diante da garota, que se pretendia no padrão daquele
princípio de década, ainda com muita água por passar debaixo da ponte.
Ciro apareceu para
pedir a segunda do seu cigarro Minister, que Edu puxava com classe. Ficou por
ali inquieto até lhe pedir a chave do Chevette para um passeio rápido. Era
para um amigo, ele ficaria desfalcado mas só por um pouquinho.
- Não demore
não, Ciro – disse, num esboço de autodefesa.
- Você não vai sair
agora, está com Rose aqui no “Embalus”, é o tempo de eu dar um giro no carro.
Bem na hora que
rolava Bob Marley, o que levava um grupo de estudantes, da mesma barca de Edu, a
bater de leve na mesa, tentando reproduzir o ritmo do reggae:
NO WOMAM, NO CRY
NO WOMAN, NO CRY
- Passou nas
duas: Federal e Católica – conversava alguém de caipirinha à mão apontando um
careca no meio da rapaziada.
Bem que poderia ser
essa pessoa, que brincava com sorriso escancarado e cercado de admiração pelo
seu cabelo raspado, símbolo do sucesso no vestibular, mas não dera, conforme
explicação que prestava a Rose;
- No próximo, vou
focar melhor – disse ao ouvido dela, que se encolhera.
A inércia de Rose,
com seu rostinho branco quase encoberto pelos cachinhos pretos, era
concordância e não desprezo. Era uma
namoradeira em potencial, que se ele soltasse o braço que a envolvia, ela
arrumava substitutos a um passo adiante. Por isso, trazia-a no grude entre
beijinhos e garros. Volta e meia, recebia cumprimento de uma coleguinha que,
passando por ali, notava um contentamento aflorado por aquele encaixe:
- Boa, Rose.
Mas quando julgava
caminhar nas águas calmas das possibilidades que oferecia uma paquera com Rose,
eis que de cá ele viu um moço encarando-o na mesa. E isso o fazia afastar-se de Rose, que mais
uma vez se encolhera e ele tinha que trazê-la mais ao peito.
- É meu irmão, ele é um louco
quando bebe; ele me bate – Rose começava a tremer com um choro miúdo e
entrecortado.
Não ia tomar satisfação, como
pedia a ocasião. Lembrou que quando era criança tinha como desculpa que por estar
de banho tomado não iria para a briga. Então, Edu preferiu apostar na
autoridade que a prima poderia exercer sobre o rapaz.
- Calma, Rose, vamos esperar
minha prima chegar, ela que vai resolver essa parada.
E resolveu, porque chegou a prima
e foi até lá falar um bocado de coisas com o mal encarado do irmão bêbado, que,
pelo menos, para não estragar de todo o verão, deixou o barzinho sem alardes.
Nesse dia, feliz por ter
conhecido Rose, o duro foi ver Ciro chegar com o Chevette já noite andada.
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