sexta-feira, 28 de maio de 2021

O quarto de visita

 


 

Ninguém ali entrava. A não ser para limpeza periódica, quando botavam coisas para fora no processo de varredura e lavagem do quarto. Peças que ainda nem tiveram uso, quanto mais! Dizem que era para a tia, que havia casado recentemente, quando aparecia em dia de missa. Pelo menos uma vez, numa manhã, o casal foi visto se despedindo por lá.

- Saem, meninos! Vão brincar lá adiante. Aqui dentro não. Retirem-se daí, era uma das encarregadas, na labuta, com balde de água e vassouras no esfregão, no preparo para encerar o piso numa segunda demão.

Deixavam no capricho. Tanto que, segundo se dizia, daria para comer no chão, e depois lacrava, como de costume.

- É o  quarto de visita, dizia-se.

Que havia de tão interessante que não podia ser do nosso bico? Visita nenhuma aparecia por ali. E quando aparecia, a pessoa ficava era no quarto dos meninos ou no da empregada, conforme a conveniência. O quarto de visitas entregue às moscas, aguardando, aguardando, quem nunca chegava. Aquilo ia me encucando de tal maneira que uma vez em comentário com minha irmã, deixei escapar:

- Um desperdício!

- É, meu filho, e se num belo dia aparecer? Vai ser feio pra família, rebateu minha irmã mais velha, preocupada.     

Lembrou que nossa família prezava muito o nome, os valores de um bom anfitrião. Tudo tinha reservas de prevenção para o inusitado, o extraordinário. O jogo de louças na cozinha, o de toalhas e outro de cama no quarto..

- ... Do elefante branco, pensei mais ou menos alto.

-  Isso é pra quando chegar uma visita.

Lá uma dia minha irmã me chamou num canto e perguntou se conhecia o quarto de visita  da casa de dona Nida, a vizinha. Que ela viu aberto, uns móveis novinhos ainda envolvidos em plásticos, papelões e faxinas, essas coisas do novo, só que velho de não uso.

- Não, respondi.

Mas o que ninguém me explicava era aquele zelo pelo quarto. Um quarto que, no final, dele não se fazia uso – uma espécie de  recanto sagrado. Até o dia em que a gente brincava de esconde-esconde e Adelaide, também nos seus onze anos, me empurrou para dentro, apressada e ofegante:

- Aqui ninguém vai nos achar, bobo!

Como de fato. Só que disse assim e, numa fala de ousadia, fechou a pesada porta e pelejou comigo.

 Ela vestia um shortinho curto de cor beje, que não deu trabalho nenhum para tirar.

 

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