terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Desconforto

 

LOGLINE: considerada simples embrecho pela família, sua namorada avisa de sua chegada no feriadão, e isto o levaria a um desconforto.  

 

 

Sempre que convocado, um incômodo se lhe disparava por inteiro. Ora com roupa, ora com falta de grana, ora com nada, incômodo simplesmente. Questão Íntima que, desde há muito, como um assombro, já o perseguia.  Tinha que andar com esse desconforto. Afinal, provisório, calculava-se.  E a coisa ia prosseguindo. Até esse impasse como agora. Que rumo tomar? Ela falou que viria passear no feriadão. Que esperasse. Era doida, era? Como que iriam encarar esse recente namoro? Ainda mais  que a mãe, nas vezes que o tinha visto com ela, nas férias, no interior, tomou-o como simples paquera, com  uma observação, que era uma sentença:

- Essa é moça pra casar.

Como se fosse para ele desocupar, nem passar perto.  Ela,  moça feita, ele nem terminara o ensino médio, moleque. Um avião de moça, graúda, não ia deixar passar para mãos alheias, se era para casar,  pois então... E abraçava aquela beleza de corpo. Como se fosse dele.  Misto de proibido e sagrado. Diferença de idade, casamenteira,  essas conversinhas, sustentava a torcida contra. Como se fosse.

- Gol bonito! - ela vinha para o abraço, invadindo a quadra na hora que fazia um gol, nas tardes de “babas”.

- Obrigado, Tesouro.

Iria chegar. Vinha para casa de uma amiga que também morava na Capital. Ainda bem. Imagine se fosse para ficar na casa deles, ele,  um adolescente, e irmãs, a mais velha de brigas com o marido. Não dava para encarar. Ela na maior inocência. Como iria ser essa vinda? Não adiantavam mais subterfúgios. Era o mundo se acabando:

- Os pais não ligam mais pra ela não?! Ou soltaram a moça assim?!

- E esse povo de hoje obedece a pai? Mas qual, gente!

Era o que se colhia das conversas em volta na casa durante as férias no interior. E essa menina queria conhecer a Capital com o namorado, ôxe. Que maravilha! Que que tinha? Mas ela era moça de curso médio terminado e juventude explodindo pelos poros. Iria enfrentar vestibular, daí a negativa dos seus pais, que via ali uma paquera de verão apenas, sem passar adiante. Imagine, moça pronta, não estavam vendo!

- E bonita, a danada.

Uma pegação do corredor à porta da rua, que ganhavam, mordendo em revezamento uma maçã.

- A vida é assim – dizia a moça graúda entre beijos que levava.

- Se não for, faça de conta – respondia Gustavo.

- Esses meninos... – dizia-se.              

E se dizia mais, a valer, quando avistaram uns aluninhos assustados com um garoto que chegava e, hora de recreio, abraçava a professorinha deles.

Quando a envolvia nos braços,  sentia seu tipo, energia escapando pelos lados, então mergulhava nessa maciez de perdição. Exalava à profundeza, uma conexão antiga. Desse relacionamento, miúdo mas constante, criou-se uma áurea, que só eles enxergavam, e daí um outro mundo.  Deles.  Muito distante.  Eles sabiam, por isso que tocavam o barco ao sabor do vento. A qualquer instante a pausa para esclarecimento, que se fazia silenciosamente e por telepatia.

Como é que receberia essa moça? O que mostraria a ela? Pegaria um cineminha e tal? Alguém telefonaria para a mãe para dizer? As tias com a velha prosa de que o pai cortaria o carro que prometera? O mundo desabando: sua fragilidade escancarada. Como a normalidade iria voltar nos raios de uma manhã explicativa?

Embaraço? Não queria estar presente, como de fato não esteve. Premido pelas circunstâncias, a salvação acabou sendo a viagem que fora forçado a fazer para o interior naquele dia, fugindo do psicopata do cunhado, que andava às voltas com separação da irmã.  

- Você não estava lá, nem suas irmãs, e tinha um homem doido pela casa.

-  Ele fez alguma coisa com vocês?! – gritou Gustavo.

- Não. Nós caímos fora.

Ufa!

 

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