domingo, 8 de setembro de 2024

Mulheres que somem

 


 

Mulheres que somem. Gustavo teve umas tantas, que a caixa de saudade se encheu delas e travou, Somem de vez ou na poeira do tempo. Como, por exemplo, Branquinha, que ninguém sabia por onde andava. Havia nomes e números. Essa, por exemplo, era a de no. 3. Outras Branquinhas também existiram e chegaram a passar por ele. Nessa tentativa de organização, algumas escapuliram e se perderam. Essa tinha três filhos pequenos. A explicação que prevalecia era que dela eram só dois, o  outro era irmão caçula deixado pela mãe.

- Olhe lá sua Branquinha – apontava o garçom, colega de trabalho dela.

Não se exibia, mas nela podia-se perscrutar um corpo sarado de elegante  mulher. Tinha que se virar, dar o duro, prestar serviços de auxiliar de restaurante, quando era tolerada no voltar para casa com suas trouxinhas de comida. Depois, á noite, tinha que se virar num trampo de frentista do posto de gasolina. No mais, arrumar uns trocos em outros serviços e até enfrentar galanteios, nos limites dos descaramentos, que com ela ninguém podia se fazer de besta.

Freguês assíduo do estabelecimento, Gustavo acompanhava o esforço de Branquinha. Tal a liberdade, que um dia, numa brincadeira de gata ladrona, ela roubou de Gustavo uma nota alta.  Quando se ergueu para ralhar com ela, avistou sua estampa vindo  de lá com uma filharada. No detalhe, a irmã no apoio, ajustando as roupinhas das crianças. Mas, nesse particular, observava-se a maldade dos fregueses:

- Dizem que a irmã dela é que é descaradinha.

Gustavo falava “roubou” para ela desconfiar e devolver sua grana, mas falou mais alto o instinto maternal da gata ladrona, com a escada de filhos pequenos para cuidar. Foi pelo bom senso que Gustavo decidiu. Após ela, pretextando dar o caso por encerrado, resolver empurrar Gustavo com a bunda. A maravilhosa Branquinha  não deixava que se ultrapassasse, que se fosse adiante. Também dela se sabia pouco.

Despedia-se da filharada e, rumo à cozinha, vestia um avental com a elegância de uma mamãe gata.  À noite, apareceria de macacão de frentista para, como quem distribui agrados, relativizar as estapafúrdias cantadas que levava.

        

 

 

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