sábado, 12 de novembro de 2022

A libélula

 

 

Como uma libélula, em vôo de galinha, o garoto saiu por aí atrás de um besouro morrinhento, estilo vestiu-uma-camisa-listrada-e-saiu- por- aí. Guiava-se na base do custe o que custar mas acabou deparando com uma moça velha, no dizer da localidade, que muito modificaria seu propósito. Moça que passou da idade de casar. O dobro da idade dele. Ele que era um terceiranista do curso de Letras, pronto para voar,  naquele início dos anos 80.

         Gustavo, cabelo pedindo corte, barba por fazer, bolsa a tiracolo, num estilo universitário. Apresentaram Gustavo a essa moça branca e sozinha. Não, com o charme de um cigarro Carlton entre dedos. Camiseta Hering, cabelos castanhos encobrindo o detalhe do brinquinho,  lábios com discreto batom,  e com certeza algum dinheiro amoitado na bolsa, como uma mulher na esfera de liberada. Ela se mostrava uma fumante habilidosa

         “Ao menos um ruge, para encarar. O nome dela é Ana” – alguém na apresentação lembrava quando Gustavo se acercou como interessado.

Dois beijinhos no rosto de feição agradável e mais alguns esclarecimentos, encaixou-se em dupla com a irmã de um dos poetas do livro de coletânea lançado naquela noite literária do ano de 1981.  Apenas um motivo. Em meio as patricinhas de sempre, ele vibrava com Ana, como um troféu em punho (um brinco brincava de trapézio na orelha, apesar de não ser nenhuma gatinha, livre de assédio).  E no diálogo, ela percebia essa sua ousadia, que antes procurava arrefecer o entusiasmo dele. Isso, nessa busca,  o tirava do rito de aventura adolescente e fazia enveredar pelas águas calmas da probabilidade concreta de sexo, sua obsessão de vida ou morte.. 

“Por que você não acompanha seus colegas? Olhe lá: cada um se armando e cadê você? ” – ela resolveu falar, e ele reparou firmeza no seu timbre de voz.

“Ao lado de você, Ana” – soprou  no ouvido de Dália.

“A gente não pode. Você perde seu tempo,  menino.” – ela falou depois de um silêncio.

Entendia que falava da diferença de idade. Boazinha no abraço, não queria largar essa tia descolada:

“Deixe que eu perca meu tempo com você, Ana: pra mim, é um aprendizado! “ – disse num afago encostando-se mais num abraço.

Entendendo como uma cantada, ela, dominadora, sorriu.

“Vou- me embora pra São Paulo amanhã”.

“Ôxe! Depois que bagunça comigo vai embora?”

“Vou pra S. Paulo e tenho que ir”- disse erguendo-se para o ponto de ônibus,  talvez com medo da cantada.

“Te ligo pra dar um alô”.

Passou o número a ela, que o guardou enfiando o papelzinho no bolso traseiro da calça jeans. Por ora, ficariam assim: ele olhando o rosto alvo mas cansado, cabelos castanhos, e ela olhando um menino com esforço de rapaz comum, moreno e playboyzinho, que procurava diferenciar-se  dos demais nos rasgos de maturidade.

“Você vai me ligar mesmo amanhã?“ perguntou.

Ela  botou em Gustavo os olhos pedintes com convicção:

“Vou”.

“Já é tarde, eu te levo até a Avenida Sete. Meu carro está ali” - falou com mais moral que lhe dava o carro novo.

Acabou cedendo. Foram para o seu Voyage, onde labutaram um bocado, antes de deixá-la na avenida. Foi lá que os corpos se resolveram  num trato mais apurado de masturbação: estalos de fivela, romper de fecho eclair, cós de calcinha, cheirinho de boceta em mãos estudadas; lábios e... grunhidos.

Não podia morrer como uma libélula tonta, num giro de satisfação carnavalesca, dia seguinte a empregada veio dizer que Ana ligara para ele para informar que estava embarcando para S. Paulo.

“Só isso?”

“Ah, pediu pra não te acordar. Deixou um abraço”. 

        C

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